Desde a promulgação da Lei nº 12.441/11 debate-se a possibilidade de uma pessoa jurídica constituir uma Empresa Individual de Responsabilidade Limitada – EIRELI. Para alguns juristas, a redação final da lei permite tal situação, ao passo que, para outros, não teria sido esta a intenção do legislador.

A celeuma se inicia pelo conflito entre a previsão inicial do projeto de lei (PL nº 4.605/2009) e a redação final da lei. Constava no projeto inicial que a EIRELI seria constituída “por um único sócio, pessoa natural, que é o titular da totalidade do capital social e que somente poderá figurar numa única empresa dessa modalidade”.

A redação final, porém, dividiu esta previsão em duas partes, mantendo uma parte no caput do Art. 980-A, do Código Civil, e transferindo o restante para o § 2º do mesmo artigo, sendo esta sua redação: “A empresa individual de responsabilidade limitada será constituída por uma única pessoa titular da totalidade do capital social (…)”; “§2º A pessoa natural que constituir empresa individual de responsabilidade limitada somente poderá figurar em uma única empresa dessa modalidade”.

Analisando a alteração na redação, bem como o fato de que o caput do artigo mencionar apenas a palavra “pessoa”, entende-se que a lei não limitou o uso da EIRELI apenas à pessoa física, permitindo que qualquer pessoa a utilize, inclusive a jurídica. Proibiu-se apenas as pessoas físicas de constituírem mais de uma EIRELI. Esta é a interpretação dominante entre os juristas.

Por outro lado, este mesmo conflito entre as redações é utilizado pelos juristas que discordam desta interpretação. Argumenta-se que o legislador teria apenas se “esquecido” de repetir a palavra “natural” após a palavra “pessoa” durante as alterações na redação, uma vez que não haveria nenhuma indicação, na tramitação do projeto, de que esta expressão teria sido retirada propositalmente.

Ainda em defesa da proibição, argumenta-se que, no direito estrangeiro, a empresa individual só pode ser constituída por pessoas físicas. Vale frisar, no entanto que a lei estrangeira não pode ser único parâmetro, haja vista que cada país tem sua realidade.

A celeuma é ainda agravada pela Instrução Normativa nº 117/2011, do Departamento Nacional de Registro do Comércio (DNRC), que regulamentou o procedimento das Juntas Comerciais, vedado, expressamente, a constituição de EIRELI por uma pessoa jurídica. Acontece que, nos termos do art. 5º da Constituição Federal, “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (princípio constitucional da legalidade). Seguindo este raciocínio, se a lei não proibiu a constituição da EIRELI por pessoa jurídica, não poderia o DNRC fazê-lo.

Para completar o debate, a 9ª Vara da Fazenda Pública do Rio de Janeiro havia concedido liminar em favor de uma empresa, obrigando a Junta Comercial daquele estado a aceitar a constituição de uma EIRELI por uma pessoa jurídica. Entretanto, a decisão foi revogada pelo Tribunal, mas apenas por uma questão de competência, entendendo que aquele não era o foro competente para tratar a questão, mas sim a Justiça Federal da 2ª Região.

Do ponto de vista legal, a questão é bastante controversa. Teria o legislador intenção de permitir que as pessoas jurídicas constituíssem EIRELIS? Fato é que a lei não veda, mas o DNRC entendeu que o legislador não tinha esta intenção e, então, vedou sua constituição por uma pessoa jurídica, excedendo, porém, a sua competência. Parece-nos mais acertado o raciocínio de que uma pessoa jurídica possa criar uma EIRELI, haja vista que a lei não proibiu.

Só haverá certeza sobre esta possibilidade quando o judiciário se pronunciar a respeito, ou, se houver uma mudança na redação da lei. Para isso, é preciso que as empresas interessadas busquem o judiciário ou procurem seu parlamentar para que fomentar a mudança na lei. Ambos os caminhos, porém, são longos.