Como será o mundo daqui um ano? E daqui 06 meses? E daqui 1 mês? Estamos vivendo um momento de grande incerteza e não somos capazes de responder perguntas simples sobre nosso futuro. A crise da Covid-19 deixou a vida como conhecemos em suspenso.
Mas como ficam os negócios que estavam contratados até então? Eles continuam… ou será que não?
Vamos falar sobre isso de forma prática. Tenha em mente o seguinte: a incerteza envolve tudo nesse momento e não sabemos o que o judiciário vai decidir no futuro. O que podemos adiantar é que as decisões vão variar de caso a caso.
Então, o que fazer?
O importante é negociar! E vamos dar argumentos para tornar isso mais fácil. Lembrando que não existe certeza, por isso busque o melhor resultado que puder na negociação, já que o que for acertado será uma certeza. Pode ser boa ou ruim, mas será uma certeza num tempo de incertezas.
Vamos, então, falar dos argumentos legais para a negociação!
1) Onerosidade Excessiva e Teoria da Imprevisão
Nossa lei prevê que, nos casos em que situações imprevisíveis (como a Covid-19) tornem desproporcionais o valor em relação ao que vai ser entregue, é possível pedir a um juiz que reequilibre os valores (artigo 317, Código Civil).
A lei prevê, também, nos casos de pagamentos parcelados ou assinaturas, que se a situação imprevisível tornar a prestação de uma das partes excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra parte, o devedor pode pedir o fim do contrato ou a redução do seu valor. E o credor, claro, pode propor modificações no contrato para evitar o encerramento. O mesmo vale para quando só uma das partes tiver obrigações a cumprir (artigos 478, 479 e 480, Código Civil).
Ora, se você pode pedir ao juiz para revisar o contrato em situações excepcionais e imprevisíveis (justamente o caso da Covid-19), você também pode buscar negociar diretamente com a outra parte. É claro que a outra parte não está obrigada a aceitar a modificação do que foi contratado, mas, sabendo que, numa situação como a atual, a lei autoriza o juiz a mudar as regras do contrato e a encerrá-lo – e alertando isso à outra parte – você terá muito mais embasamento para pleitear a modificação e sugerir que economizem dinheiro ao se ajustar sem ter que ir para a briga. Vale a tentativa!
2) Caso Fortuito e Força Maior
Apesar da lei ter um texto complexo e que permite várias interpretações, os tribunais e a doutrina entendem que em caso de situações excepcionais, eventuais prejuízos não podem ser repassados para outra parte – salvo se ela tiver assumido expressamente esse risco. Ou seja, atraso na entrega, por exemplo, pode ser plenamente justificável ante a situação atual e não poderia ser considerado descumprimento contratual.
Multas e outras punições dos contratos podem ser afastadas com base nessa regra. Novamente, busque a negociação lembrando ao outro lado que estamos vivendo uma situação absolutamente imprevisível e que traz impactos a todos.
3) Boa-fé objetiva e Função Social dos Contratos
Embora esses conceitos sejam teóricos e abertos a interpretações, o resumo da história é que nenhuma das partes deve utilizar o contrato para obter vantagem sobre a outra e os contratos não podem gerar graves distorções na sociedade. Os contratos servem para ajustar relações em condições de normalidade e sempre deve ser buscado o equilíbrio das relações.
Se uma das partes está tendo vantagens em relação à outra por conta da pandemia, essa relação tem que ser revista, como se esperaria em uma conduta de boa-fé das partes – a qual, de forma objetiva, presume-se que deveria estar presente em todas as relações, pensando no que o homem médio faria. Em resumo: está todo mundo negociando e é isso que se espera de alguém que passou a ter grande vantagem sobre a outra parte, ou, ao se verificar que a outra parte passou a ter extrema desvantagem.
4) Diálogo das Fontes
Essa é uma teoria que defende que, se não houver uma previsão de solução numa lei, mas, se existir outra que fala da mesma matéria e lá tiver uma regra, essas duas leis devem dialogar e se complementar.
Exemplo prático: a lei de locação prevê que as partes podem renegociar o valor de aluguel e que, se após 03 anos do começo da locação não chegarem a um acordo, podem pedir a revisão do aluguel na Justiça. Mas a lei não fala nada sobre situações excepcionais. Por outro lado, o Código Civil traz as regras que vimos acima, que permite rediscutir o valor em situações excepcionais.
Ou seja, mesmo não tendo isso expressamente previsto na lei de locação, por meio da Teoria do Diálogo das Fontes, seria possível trazer essas regras do Código Civil para ser analisado junto com as regras da Lei de Locação, afinal, as duas leis regulamentam contratos (inclusive de locação).
No Brasil essa teoria é capitaneada pela doutrinadora Cláudia Lima Marques. Vale a pesquisa!
Conclusão
Esses são apenas alguns dos argumentos que podem ser utilizados. O que é importante ter em mente é: quanto maior certeza você conseguir nesse momento, melhor!
Então, leve esses argumentos jurídicos para conversar com a outra parte. Se a lei permite buscar a Justiça para renegociar a relação, melhor economizar dinheiro e refazer o acerto sem precisar gastar com processo. Renegociar é a palavra de ordem! Todos estamos sofrendo com a crise da Covid-19. Precisamos – TODOS – nos apoiar e nos ajudar nesse momento.
E, nunca é demais lembrar, conte sempre com um advogado para ajudar nesse diálogo!
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Por: Bruno Accorsi Saruê
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